domingo, 15 de novembro de 2009

Bom senso e senso crítico



Ontem fui assistir ao “Show” de Talentos do Colégio onde estuda a minha neta. Saí de lá com a angústia gravemente aumentada.
Crianças dançando e cantando.
Normalmente, pra quem trabalha com espetáculos cênicos, (o meu caso) é uma maçada assistir a macaquinhos treinados, com suas indefectíveis mães (mãe de miss é um arquétipo que mete medo!) que sacam de bolsas, que trazem nos meios das pernas, um arsenal interminável de câmeras fotográficas, câmeras de vídeos, celulares que fotografam e filmam, lanches, escovas de cabelo, coleções gigantescas de toda sorte de maquiagem, malas de presilhas para cabelos, garrafas de coca-cola, sanduíches do Mcdonalds, danoninhos, álbuns de fotos, pulseiras, brincos, anéis, colares, revistas Caras, portfólios e aquela coisa que, quanto mais excitadas ficam, mais os meios das suas pernas produzem coisas! Medo! Mãe é mico mesmo!
Com essa azáfama de mães produzindo coisas impensáveis na platéia e o meu medo aumentado, entram duas filas de crianças com um miserável lenço de seda sintética, amarrado à grega, no ombro, dançando (?) música indiana com cara de “música-americana-para agradar-aos-brancos-que-suportam-a-cultura-negra” e as macaquinhas mexendo braços e pernas e cabeças conforme o que viram na última novela da TV Globo - já, em si, um arremedo pobre da cultura indiana/hindu. (Aí, galera, vocês sabem que hindu e indiano são coisas distintas?)
Depois, acreditem, tudo foi possível. O imponderável existe!
Todas as shakiras com ou sem os pares de todas as costelas estiveram presentes.
Para salvar a noite, uma garotinha dançou (dançou mesmo!!) um belíssimo frevo com música de Alceu Valença! (Valência!!! ainda existe a resistência!).
Mas momice de crianças é fato comum. Os comportamentalistas chamam isso de “comportamento imitativo”.
O que me causou espécie e cravou fundo na minha incapacidade de compreender o mundo que existe por aqui e onde eu vivo, foi a momice bastarda da pessoa que apresentava o “show” (por que não xou? apresentação?).
A cada macaquinho que passava pelo palco, fazendo ou não qualquer coisa – abominável ou não -, a dita senhora gritava no microfone, com voz de inabalável falsidade: parabéns! Você arrasoooooouuuu!
Senhores... não me venham com suas conspurcadas intenções de afetividade e pia compreensão!
Como permitir a elaboração de um senso crítico das crianças se qualquer momice que elas façam, recebe o elogio exagerado e de extensão máxima?
Sim, claro que vale incentivar a iniciativa, o esforço, a autoconfiança delas. Óbvio. Eu tenho bom senso! Não gastem suas verborragias para me convencer do que eu já sou convencido.
Mas o bom senso deriva de um senso crítico. Iniciativa e resultado são coisas muito distintas. Esforço e resultado são coisas mais distintas ainda. Autoconfiança e ausência de autocrítica são opostos.
Para que uma criança ultrapasse a fase de símio emitindo comportamento imitativo, é necessário que lhe seja permitido ver que uma coisa é diferente da outra coisa. É preciso valorizar o que tem valor.
Uma careta, um trejeito momesco podem ser nascedouro de inúmeros talentos. Não queda dúvida. Mas afirmar, em sacrário (o palco), para uma platéia, com voz amplificada por microfone, que qualquer careta simiesca está “arrasando” é pedir, é preparar, é sedimentar, é solidificar a ausência de senso crítico.
Será que é para isso que as escolas se preparam, se constroem e se mantém? Instalar a não crítica e ter plenas e irrestritas condições favoráveis para cobrar exorbitâncias de pais sem senso crítico, capazes de aceitar e considerar qualquer coisa um “arraso”?
Aliás, Senhores, não sei se lembram, que arrasar significa, no seu primeiro sentido, tornar(se) raso. Depois, no seu segundo sentido – destruir, arruinar...
Será que essa arrasada (raso+ada) Senhora é de uma consciência cósmica enorme e quis dizer mesmo que todas as crianças arrasaram?

Duvido!

4 comentários:

  1. Isso me lembra umas fotos minhas, vestido de "Pantera Cor de Rosa" para as macaquices escolares... As vezes acho que "bom senso" vem com a gente de vidas passadas, pois me lembro perfeitamente como me senti desconfortável vestindo aquela merda, e como eu não queria participar daquilo, ou seja, já vim com senso crítico... lógico, que ele é pessoal e meu, então o que eu considero ridículo, pode não sê-lo... ah, enfim, sei lá!!

    Marcos

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  2. Ahhh... me manda um e-mail que eu esqueci o seu... :P

    Marcos

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  3. KUAKUAKUAKU...ESTOU COM ASMA DE TANTO RIR!!!!!

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