terça-feira, 29 de junho de 2010

psicólogas, pedagogas, psicopedagogas... bah!

















Ser Sonia Lichtman todas querem, mas nem todas podem e, por isso, não conseguem.

Ah, desculpem-me, falo de psicólogas, coordenadoras, pedagogas e essas novas, aí, que se chamam psicopedagogas. (quando ouço a palavra pedagoga, no primeiro segundo, entendo como pé da goga – pé da jactância -. Depois volto a mim e entendo que estão se referindo àquelas moças, em geral, não tão moças assim, que sabem de cor e salteado todas as indefectíveis, inúteis e mais do que ultrapassadas regrinhas de ensino.)

Pois bem, voltemos à Sônia Lichtman porque deparei-me com uma, semana passada, quando fui ter uma “conversinha” com a coordenadora da escola da minha neta.

Evidente que eu já sabia, de antemão e experiências conclusivas, que a moça era uma pretendente a clone da nossa psicóloga, pedagoga e parapsicóloga Sônia Lichtman e eu só fui lá para zombar da risível inocência e do flagrante despreparo da dita.

Senhora alta, madeixas voluptuosas, terninho, sorriso ensaiado, tudo, tudinho à maneira Sônia Lichtman... só não escondia o seu irritado tédio com o seu empreguinho e respectivas tarefas e sua ansiedade de moça que não sabe muito bem o que veio fazer nesse mundo e aí, estuda pedagogia ou coisas do gênero, numa faculdade particular qualquer para ser empregada em Colégio Comercial... ops, desculpem-me, Educacional e, assim, cumprir o honroso destino de existir sem saber para quê, trabalhar sem saber exatamente com o quê, receber um salariozinho não sei o quê e, depois de pagas as contas de manicure e salão de beleza de térreo de comercial, comprar um terninho e blusinhas de seda sintética, com frufrus godês na Marisa e freqüentar festinhas de aniversário das coleguinhas de seus filhos, em salão de festas nos blocos das quadras residenciais...

Voltemos à nossa Coordenadora. Minha neta e eu, no corredor de espera, quando passa a moça e bate nervosamente os dedos indicador e médio no relógio se dirigindo à minha neta: - Menina, já começou a sua aula! E passa, com ares de esbaforida e tecnicamente necessária àquele burburinho e àquela azáfama que dão importância a qualquer coordenação. (coordenação aqui, me refiro à sala aonde são encaminhados os alunos que não fazem seus xixis e cocôs como mandam a ordem e o sistema dos colégios comerciais... ops, de novo. No caso, um corredor com 4 ou 5 baias minúsculas – o tamanho de caber só mesmo um cavalo ou uma égua, com nomes ameaçadores, em garrafais nas portas.

Como assim? Penso eu. Venho conversar com a Coordenadora do colégio sobre a vida da minha neta e ela intenciona que a minha neta possa não estar presente nessa conversa? Essa moça deve ser uma louca. Só pode. Será que no entendimento dela, a conversa sobre a vida escolar da minha neta prescinde da presença dela? Ou eu sou o louco?

A criança ficou, evidentemente, mais tensa. Afinal, coordenadores servem para assustar crianças e determinar-lhes castigos (como transformam o que pode ser um auxílio em instrumento de punição, medo e terror!)

Olhei repreendedor para a moça que, no ar esbaforida que interpretava, safou-se do meu olhar. Para isso servem as cenas de pressa e esbaforimento. Pessoas esbaforidas não têm tempo e condições para mais nada além de manter as salvaguardas das suas ineficiências e despreparos... então, esbaforem-se o máximo que podem. Isso garante um gradiente de importância às coisas sem importância. É tiro e queda!

Quando a moça voltou ao corredor das baias, eis que ainda estávamos lá, com o mesmo ar displicente – a esta altura eu já tinha feito a minha neta saber que a única importância ali, do nosso ponto de vista, éramos nós mesmos e mais nada. Afinal comprávamos e pagamos por um serviço em direção a ela e ela e eu queríamos informações pertinentes dos resultados destes serviços.

Entramos para a baia da moça que tentou acessar um computador para lançar-me ao rosto todos os “péssimos, nefastos e mínimos resultados que a minha neta andava obtendo e apresentando”. Coitada da moça. A eficiência dela, todo o seu ar esbaforido, todo o terninho e toda a sua altura ficaram acanhados... o computador – a medida da significação maior – não funcionava! A moça teve que procurar outra baia e se contentar com a humilhação pública de não dispor de material e instrumentação eficaz para mostrar toda a eficácia dela. Eu ri comigo. Adoro ver os teatros se desfazerem em realidades miúdas e cotidianas. O cocô normal da vida nossa de cada dia. Importante em si mesma e não naquilo que usamos para dar importância a ela, como bijuterias baratas e coisas e taleigas que se lhe agregam e se carregam.

A moça, depois desse incidente que, evidentemente, a constrangeu, postou-se à mesa, com a “águia” e o “leão” para frente e foi, de súbito, à taboa de sua salvação irrestrita – o teclado do micro – buscar os resultados das notas da minha neta!

Vontade me deu de fazer um grande cocô na cadeira – (Hugo, você mais uma vez comprovou o seu gênio fazendo aquele cocozão pastoso na mesa do Zé Celso!) – pela vergonha de ser eu também, psicólogo e pedagogo e ver a grande enormidade de merda que todos nós fazemos com essa coisa de “ensinar, educar” os mais novos. Puta que pariu, perdoem-me a expressão chula, mas é o mínimo para aliviar a minha angústia diante da impossibilidade de fazer o meu tão desejado cocô na cadeira da baia da coordenadora do colégio comercial!

Apenas disse a ela: esses resultados eu já sei, Professora... e com todo o meu ar de enfado, a fiz saber que sou psicólogo, sou pedagogo, trabalhei mais da metade da minha vida como regente de sala de aula e diretor, desde a primeira série do primeiro grau até a terceira do segundo e hoje ministro aulas para o terceiro grau; que blá, que sou contra o ensino formal, que sou rebelde, revolucionário, e blás e todos os mais blás que pude falar.

A moça cruzou as pernas. A moça passou a ficar sentada sobre apenas um dos ísquios. A moça cruzou fortemente os dois braços sobre o touro e, ato contínuo, levou o leão e a águia para trás. Bingo! A minha suspeita não era só um preconceito. Confirmava-se o meu conceito.

Dever dela continuar a expor os objetivos daquela escola, já que eu havia perguntado sobre os mesmos. A moça precipitou-se naquela verborragia aprendida e decorada nas reuniões de coordenação – asseguro, aprendidas e não apreendidas – numa tentativa que já demonstrava desamparo, expor para mim aquela coisarada toda e, o pior, que a culpa dos resultados da minha neta era unicamente dela.

Tentei interromper, como o mesmo ar de enfaro que expus desde o começo. A moça reagiu, Senhores! A moça tem alguma atitude. Levantou e espalmou a mão direita a me sinalizar que não interrompesse o seu discurso. (será que teria sido movida pelo medo de ser interrompida e não conseguir voltar ao ponto em que parou e ter que começar tudo de novo?).

Parei. Dei a ela tempo para respirar e continuar. Eu sabia que ela criaria para si a armadilha mais adequada para mim. Foi quando ela citou a palavra ensino e eu cortei o ar, naquele gesto típico dos europeus quando querem dizer que pare com isso porque tudo isso é uma bobagem – com a mão, de cima para baixo e disse a ela, de chofre: professora, num sistema escolar é preciso entender a educação como um processo de ensino e aprendizagem. Ainda dei uma esnobada lingüística afirmando que ensino/aprendizagem não é um sintagma, mas sim um conceito. Se há ensino, há aprendizagem. Se a minha neta não apresentou aprendizagem, pode ser que não tenha havido ensino.

A moça, mais uma vez golpeada no coração do seu despreparo, tentou ainda dizer que a culpa dos resultados era da criança e dos pais que não a ajudavam em casa, nos seus deveres e lições – ai minha deusa dos pés de cabra! como as pessoas falam merdas que leram ali e acolá sem saber, nem se interessar que pastel pode não ser sempre aquela coisa que se come junto com garapa, na rodoviária do plano piloto!

Mais uma vez, agora pleno de empáfia, eu perguntei a ela se ela viria diariamente cumprir o seu trabalho caso não recebesse o seu pagamento... (pausa para provocação de espanto na minha interlocutora) - que caso não tivesse motivação suficiente, ela continuaria a emitir o comportamento laboral? Que se ela tinha noção de que nenhum ser vivo age se não for motivado e que não repete o comportamento emitido caso não seja reforçado?

Para a moça ficou patente que eu principiara a falar javanês arcaico!

Ainda tentou, coitada, por falta de argumentos mais efetivos, reafirmar que era preciso os pais ajudarem nos deveres escolares.

Deixei a moça recuperar um pouco do seu equilíbrio. Maldade minha bater tanto. Mas eu sou mau. Não vim a esse mundo para afagar idiotas ou acariciar a idiotia. Vim pra bater. Quem quiser, coma mais pouco, como dizem os goianos. Ou batam-me. Quem conseguir me bater vai, certamente, receber os lauréis e eu serei o primeiro a parabenizá-lo. Do contrário, circulando... circulando! (me ocorreu agora os burros que circulam em torno da pedra mó, certos de que estão caminhando em frente!).

Fiz cara de pio (piedoso e não de canto de pássaros, tá?) e disse a ela que nós, professores, somos falíveis, tendenciosos, arrogantes, comprometidos com as nossas próprias falácias e que já fora dito, anteriormente, que a educação ideal seria a troca de lugares: os professores para as carteiras e os alunos para a cátedra... meninos! A moça ironizou! Um esgar, uma carantonha!

Pausei. Ouvi, sorri, tremi e quedei vitorioso (hehehe, como a lágrima celeste de Guerra Junqueiro), levantando um dos sobrolhos, ar de admoestação disse: não sou eu quem diz. É Rousseau, Professora, há quase 300 anos!

A moça teve os estômagos revolvidos. A cada minuto ela se via diante de alguém que sabia o que estava falando, que tinha estofo para argumentar e mais, não se parecia com nenhum dos outros cordeiros, os quais ela ameaçava com o seu dedo de Sônia Lichtman, que tremiam sob as suas culpas de pagar tão caro, tão roubados e ainda assim não conseguirem ajudar os filhinhos nas suas tarefas...

Será que essa moça não percebe, algum dia, que se eu fizer os deveres da minha neta, ela será sempre aprovada e ninguém, além de mim e dela saberá disso? Essa escola curral pretende o quê? Óbvio que apenas os polpudos maços e cheques que recebe a cada mês! Compram-se e pagam-se engodos. E que os alunos e pagadores tragam os resultados...

O tiro de misericórdia na moça foi: A senhora já leu alguma coisa sobre o ensino centrado no aluno? A moça, inocentemente, me informou que não!

Eu estanquei. Ergui a águia e o leão e os enderecei para trás. (gestos absolutamente ensaiados para ocasiões de conversas e debates – qualquer político ou ator minimamente preparado sabe que isto funciona.) Fiz voz grave, denotando desconsolo e disse, do alto da minha zombaria.

- É, Professora, aqui acaba nossa conversa... se uma educadora me diz que nunca leu nada sobre o ensino centrado no aluno é hora de eu buscar uma escola outra para a minha neta...

A moça desolou-se mais e num frêmito, estertor de morte, me pergunta, ingenuamente

- O que? O livro? Não, não li o livro específico... (Pensem, Senhores... pensem!)

Expirei em ar de completo desânimo – fingido, claro – Não professora, não é um livro. É uma proposta de ensino... olhei para baixo, com olhar arrefecido e concluí: bem, não vou mudar a escola, não vou ensinar à escola coisas de ensino e aprendizagem, não vou mudar o mundo... e aí, Senhores, teatralmente, ergui-me, aumentei um tom no volume da voz e disse aparentando revolução: apesar de tentar mudá-lo há mais de 40 anos! Voltei a baixar o tom, como revolucionário velho, daqueles históricos mesmo.

E ainda houve muita coisa, Senhores, quando ela veio com a bomba e o escudo me afirmando que a escola era uma escola de resultados e que buscava resultados...

Senhores! Acreditem. Vale a pena um texto 3 vezes maior do que esse. Garanto-lhes.

Só para tira-gosto, quando a moça me diz isso, eu olho para ela com inocência e desfiro:

Uai, a escola quer resultados, mas quando não há resultado a escola deserta?

Se quiserem mais algumas doses, deixem recados. Eu falarei mais, do mais que aconteceu! Prometo.

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